quarta-feira, 2 de abril de 2008

Ainda longe de uma revolução

O governo Evo teve uma perda considerável ontem. O porta-voz da presidência, Alex Contreras, pediu demissão. Era um cara bem importante, sempre estava na mídia fazendo declarações veementes em defesa do governo e contra a oposição.

Mas o pior foi a carta que ele leu no ato de demissão. Diz que no início se deu “passos firmes e altivos” em direção a “medidas estruturais em benefício das maiorias”, mas que, ao mesmo tempo, “descuidamos de grupinhos ligados à fracassada política neoliberal e também de inimigos internos que, agora, se converteram em um obstáculo ao processo de transformações”.

Engraçado que já ouvi tais observações diversas vezes, em entrevistas ou conversas informais com políticos, dirigentes de movimentos sociais etc que fazem críticas à esquerda contra o governo Evo.

Muitos me disseram que um dos principais problemas da falta de maiores avanços no país é que justamente o Evo estaria cercado por um grupo apegado ao poder e ligado aos governos anteriores, neoliberais. Uma “burguesia burocrática”.

Convenhamos. O governo Evo não é nenhuma revolução, como alguns defendem. É inegável que, simbolicamente, um indígena na presidência é algo espetacular. As simbologias podem não ter resultados práticos imediatos, mas têm um poder de ir criando mudanças na consciência coletiva que pode servir pra gerar algo consolidado no futuro.

No caso da vitória eleitoral do Evo, acho que ela ajuda a empoderar a maioria indígena do país, a fazê-la acreditar que é possível sim influir nas decisões que a afeta. A nova Constituição, por exemplo, é inovadora no sentido do reconhecimento dos direitos dos povos indígenas.

Mas não se limita a garantir o direito a, por exemplo, educação, emprego, saúde. Vai além. Garante a autonomia, o auto-governo, a justiça comunitária. Ou seja, reconhece que eles têm o direito de viver como viviam antes da invasão espanhola e do ataque a suas culturas. Esse aspecto, sim, pode ser considerado revolucionário.

No entanto, por outro lado, o novo texto ainda é liberal. Isso é reconhecido até por apoiadores do governo, como Lucila Choque, quem entrevistei sobre o assunto. Ao mesmo tempo, muitas medidas de Evo, ou a falta delas, ainda contribuem para manter o esquema Estado burguês – neoliberalismo – oligarquia latifundiária – transnacionais.

Um dos exemplos é a chamada nacionalização dos hidrocarbonetos. Para muitos, não teve nada de nacionalização, apenas um ajuste (importante, claro), nos impostos cobrados às petroleiras. Alguns dizem que, por meio de mecanismos fiscais, hoje o governo fica com muito menos do que se propaga.

Além disso, o dinheiro do gás ainda não se reverteu em fortalecimento da estatal boliviana, na industrialização do gás ou na criação de empregos. O pior é que a Bolívia segue enviando quantidades imensas do recurso à Argentina e, principalmente, ao Brasil (a pressão do Lula para tal é gigantesca). Enquanto isso, inúmeras comunidades rurais sobrevivem com energia à lenha.

O governo ainda promete tudo isso: fortalecer a estatal, industrializar o gás, garantir a soberania energética do país etc. Vamos ver se em 2008 pelo menos os primeiros passos serão dados nesse sentido.

Um comentário:

Anônimo disse...

quer dizer que está sendo como o governo lula? todos esperavam grande mudanças, e no fim foi um despotismo liberal...que vergonha.