quinta-feira, 10 de abril de 2008

10 de abril: seis meses de La Paz...



… das cholas com seus bebês levados nas costas, dos morros (ou montanhas?) completamente tomados ao seu redor, das manifestações de rua quase diárias. La Paz das crianças com as bochechas queimadas pelo frio, do sol forte, da presença eterna do Illimani nevado, das vans que te levam para todos os lugares.

La Paz da nação e da língua aymara, dos meninos engraxates que cobrem seus rostos por vergonha dos colegas de escola, dos pedintes com cara de enorme sofrimento. Dos carros tirando fina um dos outros no trânsito caótico, da buzina incessante, das infinitas barraquinhas de rua, dos cachorros com e sem dono, das pichações políticas nos muros.

La Paz da aventura cotidiana em atravessar a rua, do sobe-e-desce de suas ladeiras, das lindas praças. Das pessoas na praça, brincando, lendo, conversando, manifestando, namorando. Esperando. Do sorvete de canela, da fila interminável no Bits & Cream, da salteña de frango, do brownie com sorvete do La Terraza, da cerveja morna.

La Paz do Bolívar e do The Strongest, do estádio Hernando Siles, do futebol na altura. Do Huyustus, um dos maiores mercados de rua do mundo, da salchipapa, da cerveja Paceña (e da Huari). Da feira de miniaturas, dos casacos de alpaca a 80 bolivianos, da Calle de las Brujas, do Gota de Agua, do Ojo de Agua.

La Paz da Festa das Ñatitas, da colorida (e sagrada) whipala, da fé católica, mas também andina. Da total ausência de McDonald’s, bicicletas e pontualidade. Do passeio noturno no El Prado, da ida à cinemateca, do jantar no Calicanto. Da Calle Jaén, da Plaza Murillo, da vista da Puente de las Américas, do Mirador Killi-Killi e do Montículo. Da sopa que antecede e da gelatina que sucede qualquer almoço.

La Paz dos turistas, dos gringos moradores, da ligação ao Brasil a 60 centavos de boliviano por minuto. Dos ótimos CD’s e DVD’s piratas, das pessoas chegando no cinema meia hora depois do filme começar. Dos “buenos días”, “buenas tardes” e “buenas noches” cada vez que alguém sobe numa van, e do “provecho” cada vez que alguém entra ou sai de um restaurante.

La Paz do sorojchi, da falta de oxigênio, do clima seco, do “calor” e do frio no mesmo dia. Da folha de coca, do mercado da coca, da vizinha El Alto, do praticamente vizinho Titicaca. Dos desfiles de bandas para comemorar qualquer coisa, das vendedoras de milho para as pessoas jogarem às pombas que inundam a Plaza Murillo. Da cerveja verde do Green Bar, do Chapare Libre do Ja Ron Café.

La Paz do sotaque “choroso”, do apthapi, a comida compartilhada, do apoio quase unânime ao Evo. De Sopocachi, Tembladerani, Villa Fátima, San Pedro, Miraflores, Villa San Antonio, Obrajes, Calacoto e Achumani. Da relativa segurança nas ruas, das distâncias pequenas, das festas nas casas. Da carne de lhama, do Pique a lo Macho, do churrasquinho no Honguito.

La Paz da perfeita acolhida a um jovem jornalista militante.

4 comentários:

Simone Iwasso disse...

sabe, vc realmente se adaptou. to vendo que vai morrer de saudades daí....

Anônimo disse...

Igão,
que delicia ler esta sua discrição de La Paz, deu pra ver que ainda falta muita coisa para conhecer...
o seu relato é emocionante.

Anônimo disse...

Igor,

Procurando umas fontes para meu trabalho de faculdade sobre índios cocaleros e a influência política, achei seus textos.

Sou estudante de jornalismo no Mackenzie e estou indo à Bolívia no dia 30 de abril. Tenho que fazer um documentário e queria saber se você tem alguma fonte que possa me passar ou se você gostaria de ser uma das fontes para esse trabalho.

Acredito que sendo um brasileiro, jornalista e correspondente na Bolívia você possa ter algum ponto de vista a acrescentar para minha pesquisa.

Aguardo resposta anciosamente.
Théa Rodrigues

e-mail:
theacaras@gmail.com
teca_pqna@hotmail.com

Thais Souto disse...

Adorei essa! Vejo imagens claras e aceleradas passando, como num filme mudo...
Beijos
Thaïs