domingo, 7 de setembro de 2008

Golpe civil?

Há alguns dias, começou a correr por alguns blogs e sites brasileiros a notícia de que um golpe civil estava em marcha na Bolívia. No dia 4, quinta-feira, o próprio Evo Morales disse o mesmo.

Bem, como moro na Bolívia há 11 meses, acho que posso contribuir com minha visão sobre o assunto.

Para mim, usar tal qualificação para o que está acontecendo aqui é alarmismo. Aliás, o que seria um golpe civil? A ocupação de instituições públicas regionais? Se for isso, então, de fato, um golpe civil está em marcha.

Mas golpe, seja civil, militar, ou cívico-militar, para mim, não é só isso. É derrubar o presidente, é passar a controlar o governo. E isso ainda está longe de acontecer (claro que posso queimar a língua amanhã).

O que está ocorrendo é grave, sim. Sem dúvidas. Os cívicos dos departamentos opositores estão tomando sedes de instituições presidenciais nas regiões, ameaçando e agredindo funcionários do governo, ocupando aeroportos etc. Além disso, não podemos nos esquecer do sempre poderoso suporte estadunidense à oposição.

Mas tais ações não possuem alcance para além dos próprios locais onde estão sendo feitas. Aliás, as maiores prejudicadas são justamente as regiões, com perdas econômicas e asfixia energética. A chance disso se espalhar pelo país através de um movimento que chegue a La Paz e derrube Evo é muito pequena. Além disso, no interior mesmo dos departamentos opositores o apoio ao presidente é grande.

Mas, mesmo que a chance de sucesso de um golpe civil seja pequena, essa é a intenção da oposição? Na minha opinião, não. Ora, a direita boliviana é racista, atrasada, autoritária, mas não é burra.

Eles sabem que o apoio a Evo é enorme, principalmente no ocidente, onde está a sede de governo. Sabem que o presidente é sustentado por fortes movimentos sociais, que estão dispostos a morrer por ele. Sabem também que as Forças Armadas estão com ele (embora nunca se deve confiar nisso). Sabem, ainda, que a conjuntura latino-americana mudou, e que um governo golpista obteria, hoje, o rechaço da maioria dos países vizinhos (mesmo com um possível apoio dos EUA).

O que eles querem, então? Mostrar força para obter concessões do governo, especialmente na questão das autonomias; impedir, a todo custo, a aprovação da nova Constituição; e, ao mesmo tempo, desestabilizar o governo o quanto puderem para que Evo, eventualmente, caia por gravidade.

Bem, se isso também pode ser considerado um golpe civil, então um golpe civil está em marcha na Bolívia desde janeiro de 2006, quando Evo tomou posse.

2 comentários:

Anônimo disse...

Prezado companheiro,

como estás? sou o Vamberto, nos conhecemos em La Paz, em maio deste ano. Fomos apresentados pelo Eduardo Paz Rada. Estive na Bolívia fazendo um estudo exploratório para a motagem de um projeto pesquisa a ser submetido a uma seleção para pós-graduação. Bem, lá se vai um bom tempo (que passou para mim sem brechas!). Encontrei por acaso teu blog na busca de informações sobre a conjuntura boliviana. Que conjuntura complicada! Teu texto me deixa um pouco mais aliviado, algumas pessoas têm interpretado à distância a conuntura e terminam imprimindo um olhar um tanto apocalíptico, como se estívessemos próximos a uma guerra civil com potencial de instabilizar o governo de Evo. O que tem me deixado apreensivo, por outro lado, é o que vai resultar do diálogo entre oposição e governo por esses dias. A oposição (fragilizada) mantém sua pauta (autonomia + ampliação da participação na exploração dos recursos naturais) e me parece que a depender do quanto o governo está disposto a abrir mão em prol da estabilidade política (pelo menos momentânea), pode haver embargos importantes no processo de câmbios. Ou, o que é igualmente ruim: os movimentos sociais mais radicalizados colocarem a prova seu apoio ao governo e ao MAS (senão ao próprio Evo).
Caro, agradeço e parabenizo pelo belo trabalho que tens feito. Tenho acompanhado suas metérias no BF.

como dizem nossos hermanos:
Cuidate!!!

Igor Ojeda disse...

Fala Vamberto!
Pois é, rapaz, o negócio tá complicado mesmo. E tb acho que o diálogo pode travar, principalmente no tema das autonomias (e dentro disso, a questão da terra).
Acho que o tema do IDH é mais fácil de resolver.
Bem, vamos ver.
Abração